“Ninguém pensa senão em mulheres e homens, a totalidade do dia é um trâmite que se detém num dado momento para permitir pensar neles, o propósito da cessação do trabalho ou do estudo não é senão começar a pensar neles, mesmo quando estamos com eles pensamos neles, pelo menos eu. Os parênteses não são eles, mas as aulas e as investigações, as leituras e os escritos, as conferências e as cerimónias, as finanças e as politiquices, a globalidade daquilo que consideramos ser aqui a actividade. A actividade produtiva, a que proporciona dinheiro e segurança e apreço e nos permite viver, a que faz com que uma cidade ou um país andem e estejam organizados. A que depois nos permite dedicarmo-nos a pensar neles com toda a intensidade. (...) O parêntese é isso, e não o contrário. Tudo o que se faz, tudo o que se pensa, tudo o resto que se pensa e maquina é um meio para pensar neles. Mesmo as guerras são travadas para poder voltar a pensar, para renovar esse pensamento fixo dos nossos homens e das nossas mulheres, naqueles que já foram nossos ou poderiam ser, naqueles que já conhecemos e naqueles que nunca chegaremos a conhecer, naqueles que foram jovens e naqueles que hão-de sê-lo, naqueles que já estiveram nas nossas camas e naqueles que nunca passarão por elas”.
Javier Marías, in “Todas as almas”
(a foto é minha)
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