07 abril 2006

Alvalade, Alvaláxia



A época começou mal, embora não inesperadamente. A Liga dos Campeões ficou para trás, a UEFA também. Nos primeiros jogos do campeonato, era tudo tão mau que eu - sportinguista confesso (o único ismo da minha vida) - deixei de ir aos jogos. O último foi, aliás, o melhor: não porque tivéssemos ganho, mas porque a derrota mandou embora José Peseiro, homem fraco para um clube grande.

Daí em diante, só falhei um jogo na televisão. Ao estádio, salvo erro, fui uma única vez mais. A minha fé tem estado no Alvaláxia, lá por cima na cervejaria, onde os jogos se vêem com o fervor do estádio, estando dentro do estádio. É um bom sítio para ver jogos, esse Alvaláxia: sabemos dos golos segundos antes de os vermos, porque há sempre um bom homem de rádio no ouvido, onde o som chega sempre mais rápido; sentimos o calor da fé e a amizade de desconhcidos que, ao nosso lado, sofrem tanto como nós com cada bola perdida, com cada remate ao lado; os golos, esses, são quase tão bonitos ali como no campo - há saltos de alegria, gritos a dois tempos (lá estava o homem do rádio a avisar), abraços que saltam como os beijos nas igrejas (aqueles que damos ao irmão do lado, que nunca vimos, mas com quem damos graças a Deus). Ali, no Alvaláxia, também damos graças a Deus ao irmão do lado, irmão de fé, irmão de clube. Ali somos todos iguais - já passei um jogo a falar com um tipo meio louco, que gritava por tudo e por nada e só sabia culpar o árbitro; já travei amizade por um dia com o senhor (de S grande), vindo dos Açores para a cervejaria; já estive por lá com um homem, de ar aristocrático, a sentir o Guimarães-Sporting como uma ode à alegria, de Mozart, Bach ou quem quiserem. Ali, quase sempre (muito bem) acompanhado, às vezes sozinho, estou em casa, rodeado dos nossos.

Amanhã, porém, o Alvaláxia não é grande o suficiente. Parece que vou ao estádio propriamente dito, mas com aquele espaço na memória, no coração. Vou estar lá a sofrer como todos os jogos, com a fé de sempre, reforçada pela esperança que os miudos nos têm trazido.

O Sporting, amanhã, será grande. Os miúdos merecem a vitória. Mas aquela gente do Alvaláxia merece-a tanto como eles.

3 comentários:

MBA disse...

Grande post. Mas, a bem da verdade, é indiferente ser no Alvaláxia, no resturante A Catedral, no estádio da Luz, ou num outro qualquer sítio do Porto.

Mas essa é a beleza do futebol. No jogo contra o Liverpool, na Luz, fiquei com um tipo ao meu lado que insultava o árbitro, os jogadores, os apanha-bolas, o treinador, os adeptos que não gritavam, bem, até o treinador dos ingleses o gajo xingou, e sem motivo nenhum. Quando o Luisão subiu às alturas, abraçámo-nos sem que antes tivéssemos trocado uma única palavra. E não mais nos tocámos, bem entendido... :-)

Outro exemplo: Barcelona. Ao meu lado ficou uma jovem que não disse uma palavra durante todo o jogo, nem com a amiga nem com o (suponho) pai da amiga, duas cadeiras ao lado. Nem aqueles ahhh, quando a bola ia ao lado, nem as palmas quando o Benfica atacava, nem sequer aquele "oooohhhhh..... hijo de puta" que gritávamos quando o guarda-redes repunha a bola em jogo.

Portanto, meu caro David, o teu post, para mim, é um hino à igualdade no futebol, não é um hino ao Sporting nem ao Alvaláxia.

Anónimo disse...

É isso, meu caro. É um hino ao que o futebol nos dá, sem nos pedir nada em troca. É um hino à fé, ao amor, à arte. Um hino ao que nos une.
DD

Imperial disse...

Boa, muito boa postada. Parabéns!

Em tom encarnado... digo-lhe que ganhe o melhor.



PS_ o Alvaláxia vai fechar ou não?