25 julho 2005

A ternura dos 80

A crítica do dia, nos fóruns, nas conversas de café, e no comment aqui em baixo, atenta à idade de Mário Soares e ao que isso significa sobre a incapacidade da esquerda em encontrar candidatos de novas gerações. O que tem mais graça na crítica é que quem mais critica Soares é que mais tem contribuido para o desgaste dessas gerações mais recentes.

Saídos de uma revolução pouco pacífica, os portugueses aprenderam a endeusar uma leva de políticos que contribuíram - supostamente - para a evolução do país. Pois. Mas como a vida política tem tendência a evoluir, logo apareceram uma série de senhores de "nova geração" para agarrar a sua oportunidade. Para encurtar a história, o país não lhes deu sequer a oportunidade de provarem o que valiam. Exemplos? Alguns, só para abrir o apetite: Cavaco foi literalmente escorraçado, apagado da história, porque era um ditador; Guterres foi corrido porque o país não lhe deu condições de governar e achava que perder eleições autárquicas era um cartão vermelho; Ferreira Leite vale zero nas urnas, porque é uma insensivel; o próprio José Sócrates é tido como o mal menor, até que alguém apareça na altura certa para apanhar o poder a cair do sétimo andar.

Em Portugal é sempre assim. Nos cafés, nos jornais, até mesmo nos corredores do Parlamento, a apetência para dizer mal é tão grande que se destrói tudo e todos, comparando quem aparece com os exemplos dos homens da revolução. A esquerda é, aliás, perita nisso mesmo: fala da revolução e dos ideiais de Abril como se falasse do nascimento do Homem. Quem com ferros mata, com ferros morre. De tanto elogiar Soares, agora arrasta-se aos pés dele. E, claro, entre dentes, sempre vai dizendo que o homem está velho. É pena, mas com tantos anos de disparates, de eleições antecipadas, de táticas políticas, de intrigas de bastidores, hoje não há quem possa ganhar presidenciais à esquerda, senão um homem, na ternura dos 80.

1 comentário:

Anónimo disse...

já agora, e porque sou citado neste post, fica aqui melhor explicado. O que me incomoda é o facto da (alegada... : -)candidatura de Mário Soares significar que a esquerda retratada pelo PS estava tão seca de ideias para as presidenciais como a garganta de manhã depois de uma noite de copos. Que funciona em circulo fechado, baralhando mais do mesmo. Que Mário Soares é um animal político, e que devia ter percebido que o seu papel agora é outro, ideia que ficou vincada depois da eleição para o Parlamento Europeu. Que o PS se baba há muito tempo com a ideia de uma presidenciais que estejam garantidas à partida, independentemente do que isso significa. Que ninguém tem coragem de dizer a Mário Soares que o seu tempo para isto terminou, e que fez o que tinha de fazer face à vida política activa: sair em estilo.
A única vez Soares me dirigiu a palavra foi para dizer "parabéns Luis". Gostaria de poder dizer-lhe isso agora nas presidenciais. Mas não posso. Porque mais do que os portugueses precisarem de Mário Soares, parece que é Mário Soares que precisa dos portugueses, e da ideia de uma vaga de fundo. É por estas e por outras que permanecemos um país de nostálgicos.
Ê, já agora, experimenta fazer, fora do circuito político, uma sondagem, informal. Eu fiz e 4 em cada 5 não se recordam que Cavaco já foi canditato a presidenciais. Fica apenas a imagem de primeiro-ministro. Com o que isso significa, depois dos que por lá andaram...