19 março 2005

Bem prega Frei Tomás - parte 2

Caro Paulo Gorjão

Começo por dizer que aprecio as suas críticas ao jornalismo que se pratica em Portugal. De uma forma geral, os seus posts sobre a prática jornalística são equilibrados. Por isso mesmo, aceito continuar discutir consigo.

1 – Não sou nada corporativo, muito menos no direito à crítica. Muito mau é o jornalista que não sabe lidar com as apreciações dos seus leitores. A blogosfera, aliás, desempenha um papel fundamental na crítica e na detecção de erros no trabalho dos jornalistas. Os profissionais só têm a ganhar com a análise crítica dos blogger’s.

2 – Desde sempre que o Paulo crítica a utilização generalizada do “off” no jornalismo político. Chegou mesmo a escrever que “as fontes não identificadas são um obstáculo à transparência”. A sua contradição, meu caro, é óbvia: se defende o principio de que o “off” deveria ser uma excepção, então não pode dar relevância a notícias feitas sem declarações oficiais ou assumidas.

3 – Mas a discussão é muito interessante. Já li no seu blog que o “off” deveria ser circunscrito a “casos de denúncia de situações de ilegalidade e pouco mais”.
Não concordo consigo. A função original do “off” passa pela contextualização ou o enquadramento da notícia em causa. Em vez de utilizar as suas palavras, o jornalista cita palavras ou descreve ideias de pessoas com quem falou.
Em segundo lugar, o “off” pode ser o veículo ideal, para as fontes e para os jornalistas, para dar um exclusivo. Se a fonte que dá o “off” for oficial, a informação tem outra credibilidade. Se a fonte não for oficial, o jornalista tem que cruzar a informação com outras fontes. Não é pelo simples facto de a informação ser dada em “off” que a mesma não tem, à partida, crebilidade. Depende dos casos e da avaliação do jornalista.
Se não fosse o “off”, o Paulo Gorjão e outros leitores não poderiam saber o que se passa nas reuniões partidárias – ou noutros encontros similares que tenham igualmente interesse público – que têm o sigilo ou a reserva como característica principal.
O “off” permite ainda chegar ao conhecimento de informações que, de outra forma, o jornalista não conseguiria. Através do “off” podemos chegar à documentação necessária para escrevemos a notícia ou a pistas verificáveis.
O principal problema do “off” tem haver com a manipulação de que o jornalista pode ser vítima por parte das fontes. É um risco que se corre. Mas só quem escreve notícias é que pode decidir se vale a pena, ou não.
Mas, como em tudo na vida, o bom senso pode evitar erros primários, como aquele de Mário Soares ter protagonizado uma candidatura presidencial consensual em 1986...
As regras do bom jornalismo são simples. Os jornalistas é que complicam. Nenhum jornalista – a começar por mim – pode dizer que não cometeu erros.

4 – Para concluir, deixo a Paulo Gorjão uma sugestão para uma nova... ou melhor, uma sugestão para uma discussão clássica sobre o jornalismo português. Porque razão os jornais portugueses não assumem nos seus estatutos editoriais o seu posicionamento ideológico ou não assumem editorialmente a defesa ou oposição a temas fundamentais para a vida da comunidade? Porque razão em Portugal a capa da falsa e inexistente objectividade jornalística serve para praticar um aguerrido e dependente jornalismo ideológico? Porque razão jornais com linhas editoriais de esquerda como, por exemplo, o “Público”, não assumem a sua tendência ideológica dominante, “vendendo” ao leitor uma objectividade que, manifestamente, não existe nalgumas notícias publicadas? E, finalmente, porque razão os 4 anos do primeiro Governo de António Guterres tiveram um escrutínio completamente diferente daquele a que os Governos de Durão Barroso e de Pedro Santana Lopes foram sujeitos?
Tenho respostas para estas perguntas, mas, porque o post já vai longo, gostava de saber primeiro o que pensa Paulo Gorjão. LR

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