1. O que há de mais grave para um sistema democrático é a ausência prolongada de gente séria e consequente no papel de líder da oposição e de chefe do Executivo. Hoje, uma vez mais, vivemos um momento de tudo ou nada – momentos que se têm repetido a uma velocidade incrível nos últimos anos, o que também não ajuda nem um pouco.
2. Vejamos, por instantes, o caso de José Sócrates. Teve poucos meses na oposição, mas ainda com tempo de surpreender ao manifestar-se contra a descida do IRS no último orçamento. Tinha razão nessa altura, mas Jorge Sampaio pregou-lhe uma partida, convocando eleições. Logo, logo, Sócrates apareceu a garantir que era pela estabilidade fiscal, pelo que os portugueses não tinham de se preocupar com aumentos de impostos.
Como uma campanha pela maioria é ainda mais difícil, lá teve que dizer isto preto no branco: não aumento e pronto. Só faltava fazer como Bush pai e dizer “read my lips”. Aliás, fez quase isso: repetiu-o, já a despropósito, um mês depois da posse, julgo que num acto de teimosia, contra as especulações levantadas por uma declaração séria do seu ministro das Finanças.
Agora... e agora? Estamos a dias de tirar a prova dos nove. O que Sócrates podia fazer de mal feito, atrevo-me a dizer, já o fez. Hoje, ao menos, que pense no país e faça o que tem de ser feito.
3. Mas hoje, ainda há pouco, ouvi outro responsável político dar um outro passo em falso. Marques Mendes, algures na apresentação de um candidato autárquico, pediu a Sócrates que “resista à tentação” de subir os impostos. Acho graça! E acho graça porque o problema de Marques Mendes é exactamente igual ao de José Sócrates.
Quem se lembra de o ver, no congresso contra Santana Lopes, a dizer-lhe que não teria escolhido o caminho da redução do IRS? Lembram-se? Então lembrem-se também de o ver a votar esse mesmo orçamento favoravelmente na AR, quando já se preparava a sucessão do trágico Santana Lopes.
Pois agora, é o mesmo Marques Mendes que pede a Sócrates que não aumente impostos. E poderia mesmo dizer, com os olhos postos na câmara: “read my lips”. Então e se o país precisar, dr. Marques Mendes?
4. Um amigo dizia-me, há poucos dias, que as coisas tendem naturalmente para o equilíbrio a médio prazo. Pois hoje, no Público, V.P.V. teimava no contrário, explicando que muitas pessoas em Portugal conhecem e têm dado a fórmula certa para fazer disto um país a sério. Dizia também que se um político aplicasse essa fórmula, seria o fim do mundo, a contestação total, o enterro do político, até a desgraça do regime. O meu amigo que me desculpe, mas eu acho mesmo que o Vasco tem razão. Read his lips.
21 maio 2005
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário