17 setembro 2004

No Reino da TV o limite para o défice é o céu

[Fiquei encarregue de vos entregar o segundo texto do nosso, ainda «independente», JCC. Aqui vai, com abraços meus a todos]

Gostaria de fazer um texto cómico, do género: o ministro das Finanças deu ontem as boas vindas aos portugueses ao Reino da Transparência e da Verdade, vulgo Reino da TV. No Reino da TV, o limite de tolerância para o défice é o céu. O défice pode ser qualquer. Enorme, se for necessário. Mas é verdadeiro, que é que o conta.

Além de indefinidamente tolerante, o Reino da TV é tranquilo. É mesmo zen. Lá não há obsessões. Há objectivos. Se os objectivos não são possíveis, paciência, pá! Vai-se a Bruxelas e conta-se a verdade. As restrições auto-impostas que vão para o Inferno.

Diáfano, tolerante, tranquilo e paciente, o Reino da TV é ainda povoado por gentes de forte pendor gregário: muitos, está bem. Sós, nem pensar. Segundo o Dr. Bagão, o problema de 2001 – o défice de 4,4% (“se a memória não me falha”, dizia ontem o ministro em entrevista) – era o de estarmos sós. Hoje, não! Está tudo assim. A Alemanha, a França, a Holanda... – a Grécia está acima dos 5%!, explicou o ministro, contando a boa nova aos incréus. Que mal há em estarmos nós, desde que com eles, em défice excessivo?

Eu queria dizer umas coisas cómicas. Mas isto é deprimente. Ou não?

Se Portugal regressar à lista negra dos países em défice excessivo, podemos dizer que terminaremos a legislatura no ponto em que começámos. No ponto em que começámos?! Não, muito pior. Com um verdadeiro Pacto de Regime sobre a dispensabilidade de quaisquer limites objectivos, quantitativos, para o défice. E literalmente com todo o capital de credibilidade ganho com o esforço de começar a pôr ordem em casa desperdiçado. A menos que não terminemos a legislatura.

JCC

Sem comentários: